A cadeirada tirou Marçal do páreo

O “comedor de açúcar” derrubou o “ironman”

Por Alex Solnik (*)

Pablo Marçal entrou na campanha usando e abusando de sua autoconfiança, preparadíssimo para atacar todos os outros, que passou a desqualificar colocando apelidos pejorativos.

Nunes virou “Bananinha”; Boulos, “Aspirador de pó”; Datena, “Comedor de açúcar” e Tabata, “Chatabata”. A sua colega da direita não apelidou.

Induzido e iludido pelos números das pesquisas, que o colocavam ao lado dos dois favoritos, dobrou a aposta, além dos apelidos passou a acusá-los de crimes inexistentes (menos a sua colega de direita), forçando-os a se defender e não tem coisa mais complicada que se defender de algo que não existe.

Tentou forjar uma realidade paralela, na qual todos seus oponentes são as piores pessoas do mundo e ele é o único virtuoso, apesar de a realidade mostrar que ele era o único condenado e preso aos dezoito anos por integrar uma quadrilha que roubava clientes de bancos via internet e integrantes de seu partido são investigados por laços com o PCC.

Confiou que, ocupando seus adversários em se defender dele, não teriam tempo para atacá-lo. Ou julgou que era tão poderoso e mau, que ninguém ousaria atacá-lo, sua resposta seria ainda mais maligna. Apostou que seu comportamento extremamente agressivo geraria medo nos demais e ele, por ser o mais forte, os esmagaria, como geralmente acontece nas fábulas de La Fontaine, e eles passariam por covardes. E ninguém quer um covarde no comando de uma metrópole violenta e insegura.

A sua aposta na hostilidade, na vileza e no mau caratismo estava dando certo até o dia em que ele percebeu que sua única chance de desbancar o candidato oficial do bolsonarismo e chegar ao segundo turno era tirar do páreo o candidato que estava caindo pelas tabelas, mas ainda mantinha um eleitorado conservador significativo, o Datena, a quem passou a fustigar sem dó nem piedade, contando que ele ficaria acuado no canto do ringue, fugiria do embate, jogaria a toalha. Era, afinal, um “comedor de açúcar” e ele, o “ironman”.

Só que o imprevisível Datena respondeu com um argumento até então inédito em debates eleitorais: sentou-lhe uma cadeirada nas costas ao vivo e a cores.

E aí o Marçal, sempre tão assertivo, tão ego-centrado, pela primeira vez na campanha, hesitou. Vacilou. Pego de surpresa, não soube responder. A princípio quis continuar no debate, mas em seguida decidiu embarcar numa ambulância, a caminho da UTI, abandonou o script do homem indestrutível para o de vítima de uma “tentativa de homicídio”, copiando a historinha da bolinha de papel na cabeça que José Serra tentou transformar em atentado, numa campanha do passado.

E aí o Marçal que achou que se vitimizar seria o atalho mais rápido para o segundo turno levou uma tremenda invertida tanto do público interno, que já está com ele, quanto daquele que planejava arrancar do “Comedor de açúcar”.

Os eleitores e eleitoras normais e tradicionais perceberam rapidamente que era uma farsa, na qual só imbecis cairiam, e eles, além de não serem idiotas como ele supõe, não querem um farsante na cadeira de prefeito; e seus admiradores esperavam que ele reagisse à cadeirada com outra cadeirada, ou sem dar a menor importância, por ser superior ao agressor, ou porque o homem é intrinsecamente violento, como ele prega em seus cursos, e não fugisse numa ambulância, provavelmente com medo de tomar outra cadeirada, o covarde ficou sendo ele, e seus admiradores não querem um covarde na cadeira do prefeito.

Pode parecer insólito, e é, mas o fato é que todas as pesquisas depois da cadeirada mostraram Marçal estacionado em terceiro lugar, descolado dos dois primeiros, e Datena, que estava quase pedindo para sair e voltar logo à TV, de repente ganhou fôlego, praticamente carregado nos ombros pelo povo, e agora fica mesmo até o fim, segurando os votos tão decisivos para Marçal.

E Marçal, que no debate do SBT confessou que nessa campanha mostrou a sua “pior parte”, praticamente saiu do páreo, porque ninguém quer ver a sua apavorante “pior parte” na prefeitura.

Moral da história: nunca menospreze um “comedor de açúcar”, nem que você seja um “ironman”.

(*)  Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais “Porque não deu certo”, “O Cofre do Adhemar”, “A guerra do apagão” e “O domador de sonhos”

Fonte: Brasil 247

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