domingo, julho 6, 2025
spot_img

Dossiê mostra como agro do MT e Pará apoiou ‘8 de Janeiro’

BELÉM (PA) – Dois Estados da Amazônia Legal, Mato Grosso e Pará, tiveram participação na tentativa de golpe de Estado que sacudiu o Brasil entre outubro de 2022 e janeiro de 2023, que ficou conhecida como “8 de Janeiro”. É o que revela o relatório “Agrogolpistas – 2025”, produzido pelo observatório De Olho nos Ruralistas, que mapeia a atuação de 142 empresários do agronegócio diretamente ligados ao financiamento e à logística de ações golpistas, incluindo bloqueios em rodovias, montagem de acampamentos e até um atentado com explosivos.

O Mato Grosso, com 74 nomes investigados, e o Pará, com fazendeiros citados por envolvimento em episódios de alta gravidade, se destacam pela participação ativa na tentativa de golpe. Os demais Estados da Amazônia Legal — Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Rondônia, Roraima e Tocantins — não são mencionados em nenhuma das investigações ou evidências apresentadas no relatório.

Desses Estados, apenas Tocantins e Maranhão são mencionados brevemente como parte do chamado Matopiba – região de expansão da soja e da fronteira agrícola no Cerrado, mas sem indivíduos ou empresas citadas.

Mato Grosso

Autointitulado “celeiro do Brasil”, o Mato Grosso concentra mais da metade dos nomes listados no relatório: 74 nomes (52%). É de lá que saiu a maior parte dos caminhões que bloquearam rodovias e abasteceram os acampamentos montados em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília.

Cidades como Sorriso, Nova Ubiratã e Campo Novo do Parecis são citadas como centros de articulação política e logística. O relatório denuncia que famílias inteiras de sojeiros, como os Bedin e os Lermen, enviaram dezenas de veículos à capital federal, em articulação com ex-ministros e parlamentares bolsonaristas.

Mapa de concentração dos “agrogolpistas” (Reprodução/Relatório Agrogolpistas – 2025)

Além disso, muitos desses empresários continuam recebendo crédito de bancos como BTG Pactual, Rabobank, Santander e John Deere, apesar de constarem em investigações da Polícia Federal e CPIs parlamentares.

Pará

Já o Pará aparece com menor número de casos, mas maior gravidade. O relatório identifica três fazendeiros do sudeste paraense ligados ao plano que pretendia explodir um caminhão-tanque próximo ao Aeroporto Internacional de Brasília, na véspera do Natal de 2022.

O autor do plano, George Washington de Oliveira Sousa, é natural do Ceará, mas vivia no município de Xinguara (PA), de onde partiu para Brasília. Após sua prisão, ele indicou como contato de confiança o nome do pecuarista Bento Carlos Liebl, dono de um conglomerado de fazendas em São Félix do Xingu. A família Liebl, segundo o relatório, possui cerca de 30 mil hectares na região, parte deles embargados pelo Ibama por desmatamento com uso de fogo em áreas próximas à Terra Indígena Apyterewa.

George Washington de Oliveira Sousa (Foto: Divulgação/Polícia Federal)

O envolvimento da família no atentado golpista levou a Polícia Civil do Distrito Federal a investigar formalmente Bento e Roseli Liebl. Até o momento da publicação do relatório, nenhum deles havia sido denunciado formalmente pelo Ministério Público Federal (MPF).

Outro nome do agronegócio paraense citado é Ricardo Guimarães de Queiroz, ex-vice-prefeito de Itupiranga e então presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Marabá. Ele foi preso em 2023 durante a Operação Embarque Negado, acusado de envolvimento no planejamento de ações golpistas. Em sua propriedade, localizada entre Marabá e Itupiranga, a Polícia Federal encontrou armas e munições. O pecuarista já havia sido multado por desmatamento e autuado por manter trabalhadores em condição análoga à escravidão.

A atuação dos investigados no Pará, segundo o relatório, faz parte de um “núcleo ruralista do golpe” que, embora amplamente documentado por órgãos de segurança e comissões parlamentares, segue impune e fora do foco das investigações judiciais mais relevantes.

Além dos casos individuais, o Pará também aparece no documento como parte estratégica da logística agroexportadora brasileira – principalmente por conta da BR-163, rodovia que liga o polo produtor de soja de Mato Grosso aos portos do Arco Norte. Empresas investigadas por financiar infraestrutura de acampamentos golpistas têm atuação direta nesse corredor.

Revista Cenarium
Compartilhe

Related Articles

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

- Advertisement -spot_img

Colunas

Elevação do mar pode cobrir até 100 metros de praias do Rio

Estudo prevê que a mudança pode acontecer no período de 75 anos A elevação do nível do mar pode cobrir de 70 até 100 metros...

Governo Lula liga tragédia no Texas às mudanças climáticas e critica agenda de Trump

O governo Lula utilizou a tragédia das enchentes no Texas, que deixaram ao menos 32 mortos e dezenas de desaparecidos, para reforçar a urgência...

Elon Musk cria novo partido e diz que não há democracia nos EUA

Neste sábado (5), Elon Musk anunciou pelas redes sociais, a criação do America Party, um novo partido político nos Estados Unidos. O bilionário, conhecido por...

Falta de recursos ameaça paralisar combate a desmatamento e incêndios em Rondônia

BRASÍLIA (DF) – A falta de recursos orçamentários ameaça paralisar as ações de combate ao desmatamento e queimadas nas Unidades de Conservação (UCs) em...

Eleições 2026: PT articula mega federação com PCdoB, PV, PSOL, Rede, PSB e PDT

O PT tem articulado nos bastidores a formação de uma ampla federação de centro-esquerda com vistas às eleições de 2026. A proposta ainda estaria...